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E eis que um dia acordei e tinha 30 anos.
A primeira coisa que me veio à memória foram as minhas visitas ao Centro de Saúde, quando ia levar a vacina. Lembro-me de quando as enfermeiras escreviam, a lápis, num dos cantos superiores do boletim, a data do nosso seguinte encontro. E recordo-me de pensar, sempre, que ainda faltava muito tempo e das dúvidas e projecções sobre o futuro.

Os 30 seriam, possivelmente, ao lado do Tom Cruise em Hollywood, a beber uns gins tónicos, numa espreguiçadeira na piscina.

Hoje sei que isso jamais seriam possível, uma vez que nunca me adaptaria a Los Angeles e porque a Cientologia “it’s not my cup of tea”. E para tristeza do Tom, aqui estou eu, com 30, a milhares de quilómetros de distância.

Hollywood à parte, quando acordei com 30, como seria de esperar, senti aquela necessidade impulsiva de marcar a data com um “post” profundo e sentido sobre o antes, o agora e o depois. Sobre as doces memórias do passado e os desejos ardentes do futuro.

E desejo creio ser a palavra certa para descrever o que virá mais adiante... Oh yeh!

Decido então, em jeito de comemoração, dar um belo passeio na companhia, como não, da Mosca. Para os que ainda não sabem (shame on you) a Mosca não é uma mosca daquelas que voam. É o cão mais bonito do mundo.

Lá íamos nós. Eu e a Mosca, em passeio feliz pelo centro da cidade. Eu ia feliz com 30 e a Mosca ia feliz comigo (achava eu).

Nada parecia abalar a nossa auto-confiança quase infantil, até que algo sucedeu…
Depois de termos sido perseguidas por um preto cabeludo (e refiro-me a um cão), a Mosca virginal soltou-se, fugiu-me e foi vilmente violada, à frente dos meus olhos e dos que ali passavam.

Como me parece lógico, ninguém fez nada, enquanto eu, desesperada, corria atrás do casal sedento de desejo.

Quando por fim os consegui alcançar e os apanhei imóveis no meio do jardim, depois de pelo menos um quilómetro de corrida (para mim e para estes Romeu e Julieta de quatro patas), julguei que o idílio amoroso teria terminado e reclamo para os meus braços aquele doce ser peludo, de nome Mosca. É quando me apercebo que afinal é verdade que, muitas vezes, quando os cães copulam é quase impossível separá-los. Era deixá-los aos dois ou trazê-los colados. O verdadeiro “tudo ou nada”.

A lembrança deste momento deixa-me algo atormentada, porque o cenário era algo patético: ali estava eu, uma trintona, a suar em bica e com a face da cor das rosas do jardim onde me encontrava (que variavam entre o vermelho sangue e o amarelo peido), bem no centro da cidade, em hora de ponta (só faltava o Tom Cruise a um canto a desfazer-se a rir), enquanto com uma mão tentava arrancar, daquele pénis assassino, a bicha (cada puxão era acompanhado por ganidos de dor profunda desta) e com a outra dava chicotadas secas com a trela ao negro assanhado, que manchava, publicamente, a honra desta donzela. Claro que a toda esta cena assistia um público variado e significativo, num riso debochado. Por momentos muito breves senti que era eu, que ali, onde nasceu Portugal, me entregava sem vergonha nem pudor, aos prazeres da carne.

Eis quando Deus (em retribuição por não ter entregue a minha alma à cientologia) me colocou no caminho um jardineiro com um balde na mão e uma fonte a jorrar água abundante, a escassos metros.

O que se passou a seguir é previsível, mas só para os que têm dúvidas, depois de lhe atirar com balde de água, sim, eles “deslargaram-se”.

Isto para dizer que tenho 30 anos, abdiquei de uma vida “glamourosa” nos States – contra os prognósticos do meu boletim de vacinas – mas em breve terei outra ninhada de cães.

Faça já a sua reserva!!

Em breve levo outra vacina e vejo-me, aos 40, com uma Mosca castrada.