15.07 p.m
Uma amiga minha apanhou-me num dos 274 chat a que me ligo
diariamente e perguntou-me se eu, nesse mesmo dia, tinha estado na cidade X.
(nota mental: esta cidade encontrava-se a 50 km do sítio onde eu estava naquele
preciso momento). Segundo ela, parecia mesmo eu. Em tudo (nota mental: há uma
pessoa extremamente atraente a passear-se por aí).
Parei um pouco e pensei no
assunto, antes de lhe dar uma resposta definitiva (nota mental: as coisas
definitivas são para sempre e voltamos a elas até à eternidade). Não lhe queria
mentir, nem lhe queria dar uma resposta com *verdade flexível, por isso
mantive-a à espera alguns minutos, ali no chat, enquanto fazia contas (nota
mental: uma vez disseram-me que eu devia ter ido para Economia ou Gestão ou
Contabilidade. Acho que me mentiram. Há gente que mente muito).
08.57 a.m.
Oleei a corrente, coloquei o capacete, enfiei as
joelheiras e entrei em modo cálculo.
Naquele momento eram 15 horas e 07 minutos. Tinha saído
da cama às 08.57 dessa manhã. Tenho a certeza disso porque nasci a essa hora e,
quando icei as pestanas pela manhã, achei piada à coincidência. Só reparo nelas
– nas coincidências - em tempos de crise, por isso é provável aquilo que dizem
sobre elas: que não as há.
Tomei banho, vesti-me e tomei um café. Perdi cerca de 35
minutos.
10.00 a.m.
Às 10 tive uma reunião ao lado de casa, que durou cerca
de uma hora. Eram 11.15 estava de regresso. O cheiro a alho nas mãos, à hora a
que a minha amiga me falou (15:07), era um forte indício que tinha estado em
lides culinárias. Tal como o hálito, que me indicava que terei desfrutado de um
apetitoso repasto. Ou isso ou andava a evitar algum vampiro diurno (nota
mental: toda a gente sabe que os vampiros só andam de noite, por isso confio na
primeira hipótese). Dado o estado imaculado da cozinha, calculo que terei
estado ocupada até às 14 horas.
14.00 p.m.
Das 14 horas até às 15:07 são sessenta e sete minutos, o
que me dava tempo de percorrer 50 km para lá e 50 km para cá,
ser vista na tal cidade e, ainda assim, chegar a tempo de ligar o PC e falar
com ela (com a minha amiga que me tinha feito perguntado “Hoje estiveste em X?”).
Percebi pela
janela virtual que piscava ao lado da dela, que estava numa conversa com o meu
amigo J desde as 14.14, que só tinha abrandado de ritmo quando a minha amiga me
falou, às 15.07. Desde então tinham passado 6 minutos, tempo usado para fazer todos
os cálculos anteriores (nota mental: talvez seja melhor a matemáticas do que julgava
há cerca de 500 palavras atrás).
Tinha o puzzle quase todo montado. Só me restava uma possibilidade de fuga. Entre as 10 e as
11 da manhã: nunca ter ido à reunião e ter sonhado com tudo o que tinha vivido
naquela hora. Às vezes penso que isso pode acontecer-nos, sem nos apercebermos:
fabricarmos horas na cabeça, que nunca existiram, só para tornar as outras
horas mais curtas.
Oleei a corrente, coloquei o capacete, enfiei as
joelheiras e peguei no telefone. E assim confirmei a minha presença física naquela
hora, entre as 10 e as 11 da manhã.
As contas estavam feitas e respondi à minha amiga com
todas as certezas: “Não, não estive em outra cidade hoje. Só estive aqui”. E continuei o meu
dia-a-dia, normalmente, com a certeza na minha resposta.
19.23 p.m
Umas horas mais tarde liga-me outra amiga, da mesma
cidade X, e diz-me “Estás cá e não avisas? Acabo de te ver a passar de carro.”
quarta-feira, 6 de Fevereiro de 2013, 04:05:46
a.m.